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segunda-feira, 3 de julho de 2017

'EU NÃO SOU SEU NEGRO' É UM DOCUMENTÁRIO BRILHANTE SOBRE O LIVRO NUNCA TERMINADO DE JAMES BALDWIN


Falamos com o diretor Raoul Peck sobre o legado do autor norte-americano, política e racismo.

No final dos anos 70, a década na qual os sonhos de revolução que impulsionaram uma geração morreram, James Baldwin escreveu sobre uma ideia para um livro que ele nunca viria a completar. O livro, intitulado Remember This House, seria um relato das vidas e assassinatos de três de seus amigos — Martin Luther King Jr., Medgar Evers e Malcolm X —, os mártires mais reverenciados do movimento pelos direitos civis nos EUA. Baldwin escreveu apenas 30 páginas do livro proposto antes de morrer em decorrência da AIDS em 1987. O diretor haitiano Raoul Peck, cujos trabalhos anteriores abordaram o assassinato político de um estadista congolês (Lumumba de 2000) e o genocídio em Ruanda (Abril Sangrento de 2005), retoma a busca de James Baldwin em seu novo documentário Eu Não Sou Seu Negro.


Indicado ao Oscar de Melhor Documentário, o filme de 95 minutos repassa as palavras de Baldwin por meio da narração de Samuel L. Jackson. O longa se aprofunda no cânone do autor para erguer, em termos cinematográficos, uma analogia audiovisual do livro nunca terminado. Com base nas críticas de cinema do final de carreira da Baldwin, coletados em The Devil Finds Work tanto quanto no manuscrito Remember This House, Eu Não Sou Seu Negro é um mergulho impressionante na psique de Baldwin e nos males ainda não resolvidos da supremacia branca e fragilidade branca — coisas que os liberais norte-americanos chamavam, nos dias de Baldwin, de "O Problema Negro". Peck combina material de arquivo de filmes populares, as aparições do autor na televisão, e fotografias de Baldwin com seus muitos contemporâneos apresentados no filme. Essas sequências são justapostas com filmagens de turbulências raciais mais recentes, sugerindo um contínuo entre os eventos e eras. Diretor dessa exploração poderosa da relação irracional dos EUA com raça, Peck recentemente se encontrou com a VICE para falar sobre seu novo filme e a cena política global contemporânea.

VICE: Quando você ouviu falar em Remember This House?
Raoul Peck: Ah, muito tarde. Eu já tinha acesso aos direitos. Me deram tudo. Eu podia usar tudo o que eu queria. Você pede uma opção, e geralmente eles te dão um ano com opção de renovar uma, duas ou no máximo três vezes. E eles esperam que você faça o filme e compre os direitos. Eu disse a eles claramente que não sabia o que o filme seria. Eu estava experimentando [algo] entre narrativa e documentário. Passei tempo com diferentes autores tentando encontrar o eixo certo, a história certa.
Até que, quatro anos depois, decidi que o único jeito de abordar isso era ser muito pessoal. Fazer um documentário e me dar toda a liberdade que eu pudesse — política e artisticamente, em todos os níveis, em termos de conteúdo e forma. E aí a questão era: como encontrar o ponto de entrada certo? Como eu conto o filme de um jeito muito original, de um jeito criativo onde eu me sinta inspirado. Isso veio na forma daquelas anotações. Lembro que um dia as recebi de Gloria Karefa-Smart, a irmã mais nova de Baldwin. E foi isso. Essa era a ideia. O livro que nem sequer existia, e então eu disse a mim mesmo: "Isso está em toda parte, em toda a obra dele". Então meu trabalho era encontrar e reconstruir essa obra de uma maneira criativa.
E isso me deu a desculpa, além daquelas anotações, de tirar tudo que eu tinha de Baldwin que amei minha vida inteira, todos os livros que eu tinha sublinhado, todos os temas. Isso me deu não só a liberdade, mas acesso a tudo porque pude conectar toda a obra.

Cortesia de Magnolia Pictures.

É interessante você falar dessas conexões com os outros trabalhos, com a obra dele. Eu estava pensando em The Devil Finds Work. A perspectiva histórica em que ele engajou o cinema — é marcante. 
The Devil Finds Work é basicamente uma desconstrução de como Hollywood — como a mídia, como a literatura — basicamente inventou o "nigger". Está tudo lá. E essa invenção está ligada ao poder. Ligada à economia. Ligada à história e você tem tudo isso. Então reconstruindo esse livro é, ao mesmo tempo, colocar Baldwin em todas essas diferentes latitudes e níveis, e fazer uma história sobre isso. E uma história que seria a essência de todo Baldwin.

"A história não é o passado. Essa história é o presente." – Raoul Peck

Uma coisa que o filme faz maravilhosamente é justapor filmagens das lutas negras contemporâneas e o trabalho dos movimentos passados, com o mal da vida contemporânea como um todo. Tem uma montagem marcante no final de reality shows, talk shows e as palavras de Baldwin sobre como estamos criando essa sociedade falsa, o que parece prever o futuro naquele momento.
A indústria lida com isso do mesmo jeito que lida com narcóticos. Mas isso se conecta com aquelas preocupações do passado. Se conecta com aquela sociedade que criamos para evitar a verdade do tumulto dos anos 60 e da vida daqueles três homens, e o relacionamento de Baldwin com eles naquela era. E história não é o passado. Essa história é o presente. Essa é uma declaração importante. Isso significa que você diz que você é sua história.

As coisas novas que você filmou em Nova York e em vários lugares surgiram de como você estava respondendo ao material de arquivo?
A ideia em si já estava lá, e foi se aprimorando no caminho. Há um caso onde as pessoas estavam assistindo e disseram "Bom, você tem que me dar uma data aqui, então eu posso entender, posso acompanhar". E eu disse "Não, quero seguir em frente e voltar sem que você me faça essa pergunta. Enquanto você me fizer essa pergunta, a edição não está como deveria ser".
Tínhamos uma ideia muito clara do que estávamos procurando. Minha chefe de arquivo era francesa, mas conhecia os EUA muito bem. Então ela buscava nos arquivos, na Biblioteca do Congresso, em todas essas companhias, mas também fazíamos isso na Alemanha. Procurávamos na Itália. Encontramos filmagens sobre os EUA que só existiam na televisão francesa. E a ideia também era encontrar imagens que as pessoas não conhecessem. A era dos direitos civis — você conhece essas imagens. Eu não queria usar essas imagens em preto e branco que todo mundo já conhece. Porque as pessoas não assistem mais isso. Elas vêm isso de cara e dizem "Ah, sim" e seguem em frente.

"Seja lá o que a repressão era 40 anos atrás, é o mesmo sistema, apenas usando ferramentas melhores."

Vendo, em algumas tomadas, as imagens se transformarem de preto e branco para colorido, sugere essa relação entre o passado e o presente. A continuidade da história — nossa história está aqui e agora. Hoje.
É por isso que mostro todas essas imagens, porque o tema é criar imagens e onde você não sabe o que é verdade e o que não é, e onde a cor é um sinal de modernidade e preto e branco é velho. Então mostro as imagens de Ferguson em preto e branco, e assim, consciente e inconscientemente, você reage a isso.
Seja lá o que era a repressão 40 anos atrás, é o mesmo sistema, apenas usando ferramentas melhores. Mas é exatamente a mesma coisa. O que isso te mostra, espero, que você precisa encontrar a resposta apropriada. O movimento pelos direitos civis encontrou uma maneira de se organizar, e eles eram sólidos. Hoje temos movimentos, temos raiva, temos reações espontâneas. Mas somos sólidos o suficiente para trazer uma resposta para o que estamos passando hoje? O filme questiona isso também.

Qual a sua opinião?
O que eu acho — que não é tanto o que penso — são os fatos, os fatos que: eles mataram a maioria da liderança [do movimento de direitos civis], ou os compraram. Quando digo compraram, eles mudaram de classe, eles se tornaram ricos. Ou seus descendentes se tornaram ricos, ou se tornaram nobreza. [Negros vendidos] mataram muitos deles. Alguns deles enlouqueceram. Alguns estão no exílio. Então a nova geração não teve uma transição, e alguns caras que fizeram a transição foram os primeiros rappers. Mas aí o rap se tornou comercial.

É um sinônimo de capitalismo.
Exatamente. E na TV foi a mesma coisa. Você podia encontrar alguma forma de, eu diria, resistência em Soul Train ou nos filmes black exploitation. No começo pensamos "Uau", e logo isso se tornou comercial de novo.

Já foi argumentado que esses filmes eram uma catarse vazia.
Bom, isso simplifica as coisas e te dá uma ideia. "Ah, bom, somos como o outro, mas negros". Há justiça nisso: tem um vilão negro e um vilão branco. Não estávamos acostumados a ter vilões brancos.



Antes desses filmes, Baldwin realmente falou sobre essas questões em The Devil Finds Work, que os homens negros eram dessexualizados. E nos filmes Blaxploitation eles eram hipersexualizados. 
Exato.

Não havia heróis negros que venciam, apelando para a violência. Mesmo enquanto a crença na viabilidade do confronto armado enfraquecia entre os grupos nacionalistas negros. E ainda assim, nessa reação exagerada, talvez, esses filmes perderam a chance de normalizar a luta pela libertação negra, além das lutas vividas em experiências reais da classe trabalhadora e da classe média afro-americana. 
Você tem razão na despolitização, porque o que isso fazia, basicamente, era te mantr no gueto negro. Esses filmes não te davam a imagem maior. Isso não te diz que o problema é o capitalismo. O problema é a classe. O problema é pobre de um lado e rico do outro.

Ou, como você sugere no filme através do texto de Baldwin, o NAACP era uma organização classista.
Exato. Esse é o dilema agora. Aliás, não vejo o Black Lives Matter — vejo o Occupy Wall Street, vejo muitos outros movimentos que perderam o impulso no momento em que decidiram pular para a política. Somos uma civilização onde não existe mais ideologia. Não há mais verdade científica. Não há mais verdade acadêmica. O aquecimento global existe, o aquecimento global não existe.

Você é um cineasta que já bordou temas de legado como o assassinato de Patrice Lumumba ou o genocídio em Ruanda. Esse filme é muito sobre a vida de um negro norte-americano e a realidade vivida por negros norte-americanos. O que te permite habitar, como artista, essas várias esferas da narrativa pan-africana?
Não são coisas disparatadas, essa é a questão. Fui privilegiado no começo por ver as conexões. E decidi bem cedo, com a vida que estava tendo, a vida que meus pais estavam tendo. O único jeito como posso sobreviver é ter certeza de quem quer que eu seja, sou engajado. Estou no exílio. Isso é algo que nunca aceitei. Estou onde moro, sabe? Meu pai saiu do Haiti em 1960. E eu saí em 1961. Eu tinha oito anos, e fui para o Congo com a imagem da África que eu tinha dos filmes norte-americanos — John Ford e tudo mais. E juro por Deus que cheguei para ver safáris, ver africanos dançando e sorrindo, e era isso que eu pensava. E esse foi um dos primeiros choques da minha vida. Eu cresci assim.
Então isso é parte da minha biografia. E acho que é uma liberdade nunca aceitar o que os outros diziam que eu devia ser. Baldwin disse o mesmo. Ele nunca acordou, se olhou no espelho e disse "Meu Deus, sou negro, então vou agir como um homem negro o dia todo". Eu não digo isso. Quando você cresce no mundo, você pensa sobre o mundo. O que você pode fazer para mudar o mundo? O que posso fazer para mudar o meu bairro? O que posso fazer?
Tenho amigos que viveram sempre com raiva. Eu entendo essa raiva. Entendo, porque é frustrante. Mas então, como digo a eles "Sim, mas o que você vai fazer?" Você vai fazer isso sua vida inteira? Ou vai tentar outra coisa? Por que é isso que eles querem. Eles querem que você continue com raiva.

Eu Não Sou Seu Negro está disponível no Netflix.

Por Brandon Harris - Artigo original publicado @ https://www.vice.com/pt_br/article/mgxv88/eu-nao-sou-seu-negro-documentario-livro-james-baldwin


 


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sábado, 30 de janeiro de 2016

RETRATANTO AS RAÍZES DA CULTURA DAS SOUND SYSTEM`S BRITÂNICAS


Sound System Culture

The Saxon Sound System Crew, 1983. Foto cortesia da coleção de Maxi Priest

"Uma das minhas primeiras lembranças é a do baixo vindo através das paredes quando eu era uma menina em Huddersfield", ri Mandeep Samra, curadora da exposição "Sound System Culture: London", que abre em 5 de janeiro no The Tabernacle, Notting Hill. "O vizinho costumava fazer essas festas azuis. Eu acho que provavelmente tinha algum tipo de efeito subliminar."

A cultura do sistema de som no Reino Unido tem desempenhado um papel vital na história do reggae mundial. A partir do momento que o jovem imigrante Caribenho "Duke" Vincent Forbes montou seu sistema rudimentar em 1954 em Londres, e começou a tocar ska e calipso nas seleções em volumes de abalar o peito, os sistemas britânicos mantiveram-se na vanguarda do movimento, influenciando muito a cada subconjunto de dance music no Reino Unido desde então.

Explorando a história social da cultura em cidades como Huddersfield, Bristol, Birmingham e, agora, Londres - a turnê exposição "Sound System Culture" oferece uma oportunidade para explorar uma cena que permanece tão vital hoje como nunca.

"A turnê cresceu organicamente a partir da exposição original em Huddersfield," diz Samra. "Ainda que não tenha sido bem documentado em cidades como Londres ou Bristol, por muitos anos Huddersfield teve uma cena próspera, fora de proporção com o tamanho real da cidade. A exposição documenta a vida e as experiências daqueles que estavam envolvidos, em particular pessoas que lançaram as bases para a cena em locais como o Arawak Club e Venn Stree, de lá nós exploramos Bristol e Birmingham, e agora Londres".

A partir de sessões de festas privadas de "blues" todas as noites em terraços em desintegração de West London com um sistema maciço e bares ilegais na década de 1950, para poderosos sistemas como os de Contagem Shelley nos anos 60, e através de sistemas roots dos anos 70 de peso como Jah Shaka e Fatman, e dos anos 80 como os titãs do Saxon, os sistemas muitas vezes, desde um enfoque social para as comunidades de West Indian e em Londres, se fez uma marca indelével na cultura dos graves na Inglaterra.


"Esses sistemas inicialmente surgiram de uma necessidade de um enfoque comunitário", explica Samra. "A primeira e a segunda geração de imigrantes do Caribe foram muitas vezes excluídos dos pubs e clubes. Estas festas foram frequentemente oferecidas em centros comunitários e afins. Para a exposição em Londres, tivemos links com vários sistemas e também trabalhamos em estreita colaboração com o escritor / historiador de reggae John Masouri [autor de Steppin' Razor: The Life of Peter ToshWailing Blues - The Story of Bob Marley's Wailers: The Story of Bob Marley's "Wailers"], que realmente puxou a narrativa junto. Londres foi um assunto delicado porque tem havido um número tão grande de sons que saíram da cidade. Teria sido impossível documentar tudo, mas estamos muito felizes com o que podemos apresentar."

Antes da abertura da exposição, eu me encontrei com John Masouri para falar sobre a cultura dos sistemas de som Londres e a vida no reggae.

Jah Shaka no Albany Empire, Deptford, London, 1984. Foto © Stephen Mosco

VICE: Quais são as suas primeiras lembranças do reggae?
John Masouri: Em 1968, eu tinha 15 anos, eu fui para a minha primeira festa de blues. Isso foi em uma área muito baixa de Nottingham. Já havia uma boa quantidade de pessoas do Caribe lá; Eu acho que foi a primeira geração que ia para a escola com crianças jamaicanas. Eu tinha uma namorada, e seu tio fazia festas de blues, então eu costumava ir lá. Foi muito intimidante, muito emocionante - outro mundo. Fiquei fascinado. Eu me mudei para Londres em 1973 ou 74, quando os primeiros grandes sistemas estavam começando a aparecer no [Notting Hill] Carnaval - Fatman, Coxsone, etc. Foi maravilhoso estar em Londres durante esse tempo; você não tem que ir a festas de blues mais, os sons seriam tocados em salões e clubes adequados e centros comunitários, e eu tinha idade suficiente para entrar. Mas uma coisa que eu notei foi que as coisas estavam mais racialmente carregadas em Londres. Era certamente mais amável ​​do que tinha sido nos Midlands. Eu acho que, em parte, que é apenas estar em Londres, no entanto: Londres era muito mais competitivo entre os vários sistemas, e eles foram os primeiros a entrar com material de conscientização que estava acontecendo no momento.

O assédio da polícia estava vindo forte naquela época também. Muitas vezes você estaria em lugares e a polícia iria atacá-los e todo mundo buscav fechar o sistema, fechar o clube ... Mas você meio que se acostumou com que aquilo tornava-se parte da experiência. Onde quer que os jovens se reunissem para ter um hora de lazer há sempre alguém que quer estragar tudo, sabe?

Eu acho que é certamente uma forma primária de experimentar roots reggae. Mas ele vai voltar muito mais longe, até mesmo os caras do som iniciais, como [Vincent] "Duke Vin" [Forbes] no início de 1950, ele estava fazendo o edifício trepidar, fazendo gesso cair do teto nas festas de blues que ele estava tocando ; sempre foi uma grande parte da música. Esses caras de som, que começaram, eram sempre muito competitivos em todas as áreas, sempre estavam procurando as melhores e mais exclusivas gravações; obter as melhores MC’s no microfone; ter a melhor fidelidade de som; sendo o mais alto sem distorcer. Eles mostraram valentia em projetar o som e começar tudo, construindo com as especificações adequadas.

O volume foi certamente parte disso, mas eu acho que, talvez, tornou-se um excesso de destaque no final da década de 70. As festas de blues iniciais, eram usadas ​​para ser lugares onde as pessoas se encontram; não apenas dançam e se divertem por um bom tempo, mas também compartilham as notícias de qualquer parte que vieram do Caribe. Eles não estavam necessariamente inclinando maciçamente para o volume, porque as pessoas gostariam de socializar também. Mas no momento, nos meados dos anos 70, você tinha a sua volta sons como Jah Shabba e Fatman, que foram absolutamente matadores com volume. Isso foi uma verdadeira experiência do que você por sentir, isso em um sentido corporal.

Austin "Spiderman" Palmer, fundador do The Mighty Jah Observer Sound System, no Sottotetto Sound Club, Bologne, Italy, Outubro 2011. Foto © Rita Verde

O chacoalhão no peito.
É quase como se o som habita-se seu corpo inteiro. Você se torna uma extensão das próprias caixas de som, em um sentido. E eu devo admitir, porque eu posso dizer que você o ama, bem, Harry - não há nada como a sensação de ser tomado. É como o Invasion of the Body Snatchers [risos].

Você pode me dizer um pouco sobre o que aconteceu com a cultura sistema de som na Inglaterra durante os anos 80?

Os anos 1980 foram a melhor década de sempre para reggae neste país; foi essa enorme explosão de talento, não apenas em Londres, mas em todo o país. Houve essa explosão de bandas roots em todo o lugar. Quando fitas-cassetes de sons da Jamaica - se tornaram muito populares, de repente você tinha uma situação onde o cantores nascidos na Inglaterra – que frequentaram escolas inglesas, tinham incorporado elementos dos sons jamaicanos. Você tinha contadores de histórias reais emergindo. Dubplates tornaram-se menos importantes; o desempenho dos DJs e cantores assumiu. Essa foi uma geração tão talentosa com MCs e cantores em sistemas como o Saxon.

Em 1984 Papa Levi teve um hit número um na Jamaica com "Me God Me King". Isso nunca tinha sido feito antes, na verdade, nunca foi feito, mas foi incrível. Um indivíduo novo do sul de Londres, de Lewisham, que aprendeu seu ofício em clubes de jovens locais, e de repente ele tem um hit número um na Jamaica - a casa dos sistemas de som de reggae, a casa da cultura reggae. Para realmente testemunhar DJs e MCs jamaicanos serem forçados em ter o pé atrás e, em seguida, e tomar estilos que originaram no Reino Unido, foi um verdadeiro ponto de orgulho se você estivesse no meio de tudo naquele ponto.

The Saxon Sound System Crew, 1983. Foto cortesia da coleção de Maxi Priest

Por que você acha Inglaterra cultivou um movimento tão forte?
Em primeiro lugar, tivemos uma maior concentração de imigrantes de West Indian. Em segundo lugar, eles trouxeram a cultura com eles. Não era uma comunidade insular, e, embora é claro, havia o racismo cotidiano e o racismo institucionalizado, e eu nunca iria negar que, na minha experiência pessoal [crianças inglesas e crianças de West Indian tinham muito em comum]. Haviam tantos elementos que poderiam compartilhar como amigos; foi um ajuste fácil e havia também um monte de relações inter-raciais acontecendo. E as comunidades da classe trabalhadora na Inglaterra, sempre tiveram grande amor pela música soul americana e rock 'n' roll americano. Sempre houve essa apreciação da música - que sempre foi um dos nossos pontos fortes como nação.

Onde quer que as pessoas do Caribe se estabelecessem, a partir dos anos 50 em diante, uma cena musical iria se desenvolver. Foi, talvez, mais fácil nos anos 70 porque havia muitos mais facilidades. Ao contrário de hoje, você tinha um excedente de habitação social; um monte de festas aconteciam em centros comunitários; havia muitos salões de igreja, clubes juvenis... Existiam muitos lugares onde a música poderia florescer e criar raízes. Havia um monte de bandas começando, por isso foi capaz de se espalhar. Eu não estou dizendo que sempre foi fácil, mas as instalações foram naquela época de uma forma, talvez, que eles não são hoje.

Lloyd Coxsone, fundador do The Sir Coxsone Outernational Sound System, 1978. Foto © Dave Hendley

Sim, Londres mudou uma quantidade enorme desde então; parece cada vez mais difícil para os locais no clima atual. Como isso afetou a cena sistema de som?
Vou te dar um exemplo: agora é extremamente caro para um sistema tocar no carnaval. As reclamações de moradores nos últimos anos significa que cada sistema tem de fornecer um nível de segurança fora de seu espaço, que é caro. Veja Sir Coxsone, por exemplo. Ninguém paga eles para tocar em Notting Hill, mas eles têm que contratar uma van para levar o sistema até lá; eles têm de pagar os técnicos de som que podem ser seis ou sete pessoas, que têm de pagar os seguranças; eles têm que ser responsáveis pela coleta do lixo, todas estas coisas. Isso custa uma quantidade enorme de dinheiro.

Houve um período na década de 80, quando tivemos o GLC sob Ken Livingstone, e ele estava muito pró a comunidade do Caribe, a favor da arte do Caribe. O GLC iria sediar uma série de shows nos parques e nas prefeituras. Foi um tempo muito progressivo, um tempo muito interessante a esse respeito. Mas quando Thatcher chegou, teve o mesmo tipo de pensamento repressivo de direita que temos agora. E isso nunca é bom para a música.

Conte-me sobre a colocação da exposição de Londres juntas, era difícil controlar as pessoas que chegavam que haviam se envolvido com os sistemas mais antigos?Inicialmente, tivemos de lançar nossa rede em torno de Londres, ver quem realmente tinha fotografias, que era a coisa principal. Nós não queremos usar apenas imagens de fotógrafos reconhecidos; queríamos as fontes das fotografias que tinham sido tiradas em torno dos próprios sistemas, mas não foram compartilhadas publicamente. Essas fotografias dão um tipo diferente de visão, e estamos com a sorte de ter uma grande exposição. Mas o que logo descobrimos é que um monte de caras mais velhos, dos sounds, não tiravam fotografias no passado, ou eles não são familiaridade com o computador, ou eles podem não estar por aqui mais – são cenários como esses.

Havia alguns sistemas antigos que eu realmente queria ter representado, mas não havia absolutamente nenhuma fotografia. Às vezes as pessoas me diziam: "Por que você não tirava fotografias nas festas, então?" Como um homem branco? Em uma festa de blues? As pessoas pensavam que eu era um policial já, ainda mais se eu tivesse uma câmera sangrando no meu pescoço [risos]. Nos anos 70 não havia nenhuma maneira de você sair correndo por aí enfiando uma câmera na cara das pessoas. E a outra coisa era que, naqueles dias em Londres, muitas pessoas não tinham uma câmera decente própria. A fotografia era algo que você realmente não fazia, no sentido moderno.

Mas eu acho que é incrível que as pessoas como Mandeep - que são de uma geração- que tem um enorme interesse nesta cultura jovem e estão preparados para assumir os riscos e colocar em exposições como esta. Eu vejo isso como uma coisa muito positiva. Eu gostaria de ver mais livros, mais filmes, mais exposições para realmente impressionar as pessoas, em especial, como esta cultura era e como continua a ser impressionante. A influência da cultura dos sistemas de som em todo o mundo é enorme agora. Estamos vendo sistemas na América Latina, África, Extremo Oriente. Nós nunca poderíamos ter imaginado que estas coisas estariam acontecendo, mesmo 20 anos atrás.

"Sound System Culture: London" abriu em 5 de janeiro no The Tabernacle, Notting Hill.


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